Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Evangelizar, preferencialmente, os ricos

É muito comum ouvirmos, na linguagem habitual da Igreja e não só, uma espécie de preferência em evangelizarmos/atendermos, preferencialmente, os pobres... como que excluindo aqueles que não entram nesta categoria económica, sociológica, política, cultural e tudo o resto que se lhe queira apensar.
De fato, os pobres servem para tudo e mais aquilo que se desejar, desde que dê bom proveito a quem deles se aproveita, mesmo sob a roupagem de seus defensores, na praça pública, mas, minimamente, detratores, em privado.
Deixando, desde já uma espécie de declaração de intenções, dizemos: sou pobre, filho de gente pobre e sem qualquer aspirações a ser rico.... embora sinta que os ricos também podem e, muitos, até são boas pessoas.
No entanto, sabemos e conhecemos que há – mesmo no contexto da Igreja católica (hierarquia e setores laicais) mais ou menos assumidos, camuflados e com outras aspirações – quem defenda os pobres, mas se banqueteie nos melhores restaurantes... pagando favores; quem se diga paladino dos pobrezinhos mas só se vista com roupa de marca... a custo da qualidade de vida; quem pretenda ser associado aos (ditos) defensores da classe operária (se ainda existir!), mas que privilegie, no seu círculo de convivência, os donos do dinheiro, pois dão estatuto e promoção... à sombra de outras tantas boas intenções.
Tendo estes fatores em conta, consideramos que é importante não setorial as preferências no campo da evangelização. E, se tal tiver de ser feito, então que se faça uma opção preferencial pela evangelização dos ricos por duas razões: são eles que podem, tocados por Deus, atenuar ou até mesmo fazer desaparecer os pobres; são eles quem, pondo ao serviço dos outros a sua riqueza, numa consciência social e até espírito de serviço do seu poder de riqueza, podem gerar novos empregos e com isso tentar fazer diminuir a indigência dos desfavorecidos pela sorte e atribulados pela pobreza.

= Dos pobremente ricos aos ricamente pobres
Passado – assim cremos e esperamos – o contexto dialético-marxista da luta de classses, temos de recriar uma nova mentalidade: os fatores de produção são mais do que a força de trabalho, as mais-valias, o capital e (até mesmo) o desfavor de uns contra outros e de todos contra uma certa minoria: a capacidade de construir um mundo onde todos sejam mais fraternos é mais do que uma utopia romântica e azeda!
Vivemos num tempo onde os conceitos já não se guiam pela mera momenclatura coletivista nem o trabalho é uma idolatria adquirida sem tribulações e novos desafios.
Estamos em constante mudança e são-nos exigidos novos métodos até para continuar a ter uma oportunidade de trabalho, que é muito mais do que emprego. Sentindo o efeito da globalização, crescem os sinais de que os nossos benefícios são a desgraça dos outros e que as nossas desgraças – com a deslocalização dos postos de trabalho e outros efeitos adjacentes – podem ser os benefícios de outros.
Vivemos uma, cada vez mais acentuada, concorrência a todos os níveis e a nossa frágil sobrevivência está em constante risco.

= Insegurança a quanto obrigas!
Neste contexto temos de apostar sobretudo, na evangelização dos ricos, pois da sua adesão aos valores do Evangelho poderá surgir uma nova sociedade: mais justa, mais fraterna, mais solidária, de mais verdade, de mais lealdade e com maior caridade... uns para com os outros.
Com efeito, se os ricos – com dinheiro, com visão e com aposta no futuro – se interessarem pelo bem comum, que é muito mais do que os seus interesses particulares – de lucro legítimo, honesto e sincero – poderão ser bons criadores de riqueza em favor dos outros, tanto através de empresas, como de projetos que dêem trabalho e sustento às pessoas e às famílias. Precisamos, urgentemente, em Portugal, de  que as pessoas saibam colocar a sua riqueza ao serviço dos outros.
 Não será com certos combates anacrónicos de algumas forças político-partidárias que esses ‘trabalhadores’, em nome de quem pretensamente contestam, irão ter emprego nem futuro. Cheira a conversa requentada o discurso de alguns sindicalistas profissionais, que mais não sabem do que lutar com armas já do século passado, mas que, afinal, só prejudicam o país e o tecido produtivo... mais elementar. Será eles não são capazes de ver isto? Até onde irá a tacanhez de certos indivíduos ou a insensatez de seus seguidores?

Está na hora de mudar de rumo, podendo inverter as prioridades, mas salvaguardando os princípios, tendo em conta um dos essenciais que é: as pessoas em primeiro lugar.

António Sílvio Couto

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Regime ou mentalidade... de poupança?

Com a assumpção do estado de crise mais ou menos generalizado vão ressurgindo no vocabulário corrente termos e expressões que andavam um tanto arredios na nossa conversa, tais como: poupar e poupança, remendar e remendado, restringir, não desperdiçar... contrastando com conceitos, vivências e comportamentos bem mais contentes na nossa história (pessoal, familiar, social, nacional) recente.
Antes de mais será preciso esclarecer se estamos em regime (temporário) de poupança ou se já assumirmos que a poupança é um bem necessário e uma urgência na mudança de mentalidade. Com efeito, o ‘regime’ poderá ser adaptado, modificado e subvertido se as condicionantes económico-financeiras se alterarem, enquanto a ‘mentalidade’ cria raízes e faz viver, sobretudo, em atitude de vida.

= Em espírito de pobreza... evangélica
Se escutarmos e tentarmos aprender o significado das coisas, lembraremos uma frase emblemática de São Paulo: «sei viver na pobreza e sei viver na abundância. Em todo o tempo e em todas as circunstâncias tenho aprendido a ter fartura e a passar fome, a viver desafogadamente e a padecer necessidade» (Flp 4,12).
De fato, nós, humanos, somos muito fáceis de nos acomodarmos às situações de conveniência, criando uma razoável tendência para o menor esforço e/ou esforçando-nos o menos possível. Por isso, qualquer aceno para o facilitismo – económico, laboral, moral ou cultural – como que têm mais adeptos do que até a aceitação da verdade, seja quanto a nós mesmos, seja na proporção de tentarmos enganar os outros.
Vivendo nós uma espécie de amorfismo subjetivo, temos de detetar quais as influências que sobre nós vão sendo tentadas para que nos acomodemos, tanto à maneira de pensar de uma maioria acrítica, quanto ao comportamento de mediocridade  mais ou menos reinante à nossa volta... Nas mais díspares situações vai-nos sendo impondo quem menos presta e para pouco serve, senão contribuindo para que se vá afundando ainda mais o nosso pouco alento... coletivo.

= Queixar-se, resignar-se, lutar ou participar?
É, hoje, recorrente ouvirmos as pessoas queixarem-se por tudo e por (quase) nada, recordando os tempos passados com tal nostalgia que até parece que estavámos – economica, social ou culturalmente – melhor do que atualmente... Fomos, de fato, instruídos – ou talvez antes manipulados – pelas conquistas democráricas, sem que tivessemos dado o nosso consciente contributo para a melhoria de vida que nos foi dado usufruir.
- A União Europeia (UE) despejou sobre o nosso país dinheiro, mas não veio idêntica cultura para o trabalho. - A mesma UE quase que fomentou nos portugueses tal sensação de irresponsabilidade que muitos dos nossos melhores campos de cultivos foram deixados ao abandono, pois era mais barato comprar o que vinha de fora do que trabalhar para comer o que era (é) por nós trabalhado.
- Até cresceu uma expetativa de espírito de impunidade para quem soubesse enganar melhor os nossos ‘benfeitores’ da UE... que sempre cobram pela ajuda.
Volvidos mais de vinte e cinco anos de adesão à UE está hora de acordar e de reconhecer que ninguém dá nada a ninguém sem esperar algo em troca.
. Temos de aprender com a falência do projeto coletivista da Europa de Leste.
. Temos de voltar a saber plantar e semear, regar e mondar, colher e debulhar... pois será, quando tirarmos da terra o nosso pão, que saberemos valorizar as ajudas que nos quiseram dar.
. Basta de queixumes e de lamúrias: mãos ao trabalho, já e em força. Não nos deixemos enganar novamente pelos mentores da coletivização – agora culturalmente desgraçadista – com que alguns senhores dos (atuais) sindicatos nos vão condicionando e até entretendo... Mandemo-los regressar aos locais de trabalho/emprego e saberemos a quem servem e para aquilo que prestam!
Portugal terá futuro, quando a poupança for mentalidade e não mero subterfúgio em maré de pouco dinheiro. Seremos ainda um povo digno dos seus heróis e antepassados?

António Sílvio Couto

sábado, 12 de novembro de 2011

Mais gastadores em maré de Natal?

Segundo um estudo, recentemente, publicado, os portugueses dizem que vão gastar quinhentos e setenta e cinco euros em compras na maré de Natal, distribuídos da seguinte forma: prendas (375 €), comida (150 €) e convívio social (50 €). A tão falada crise parece, afinal, que não é vivida (tão) a sério... ao menos por alguns, embora se possa, comparativamente, verificar uma quebra de 6,3% em relação às despesas natalícias, que ocorreram em 2009.
Tendo em conta as medidas de austeridade do governo e as dificuldades financeiras em geral seria de esperar os portugueses se contivessem nos gastos. Se colocarmos os mesmos dados de referência podemos ver que os alemães pensam gastar 430 euros e os holandeses 410 euros... em compras por ocasião da Natal deste ano.
Colocando ainda como referência aquele estudo podemos concluir que as consequências das medidas de austeridade entre os portugueses sentir-se-ão mais na forma de gastar do que no valor a dispender... recorrendo menos ao crédito, antecipando as compras – sobretudo aproveitando as promoções e os saldos – e oferecendo prendas úteis e mais baratas.

= Que futuro estamos a construir?
Apesar das preocupações quanto ao emprego e aos cortes na percentagem do subsídio de Natal, os portugueses vão sendo dos europeus mais gastadores. Será que esta atitude revela inconsciência pessoal, familiar e coletiva para entendermos as coisas? Até onde vai o real diagnóstico sobre as dificuldades que são difundidas? Não haverá uma economia subterrânea, que permite viver acima das contas submetidas às finanças? Os (ditos) sinais exteriores de riqueza como é que não são detetados e taxados correta e urgentemente?
Com efeito, estas e outras questões podem assumar à nossa inquietação ao sermos confrontados com aqueles dados supra citados. De fato nem toda a gente poderá afirmar que vai fazer tais gastos na éposa natalícia em curso. Nem os cerca de vinte mil inquiridos, que serviram de critério para gerar aqueles dados de gastadores, podem esconder que há muita gente sanguessuga no sistema económico-financeiro, que tentará subverter as medidas preconizadas pelo governo.
Efetivamente que se poderá dizer dos registos em cafés e restaurantes que nos fazem pagar – sobretudo esses que nós conhecemos e que até nos conhecem – a conta pedida, mas que se furtam a dar-nos o talão de pagamento? Como se poderá viver numa atitude de transparência de impostos, quando nos apercebemos que, na máquina registadora, se escreve uma parcela que não corresponde àquilo que temos de  pagar?
Somos, de verdade, um povo de chico-espertos, que se enconcha na sua autofagia e que vive tentando enganar o Estado, pois deste tenta difundir a noção de que ainda nos rouba mais do que as nossas espertezas inventam!

= Haverá, ainda, solução?
Diante de tantas desconfianças como que surge a tentação de desistir. Perante tantos fatos de incoerência como que somos levados a entrar na onda do ‘vale-tudo’. Castigados pela inoperância da justiça podemos entrar na lógica do ‘faz-de-conta’. Acrisolados pelo torniquete dos impostos podemos tentar fugir, aliviando a carga para os vindouros...
No entanto, temos, urgentemente, de assumir a nossa tarefa de:
- Viver na verdade, segundo critérios de autêntica pobreza... à luz das fontes do Evangelho;
- Criar condições de pacificação, assumindo cada um o seu papel de construtor do bem comum;
- Gerar amor ao trabalho mais do que à preguiça e à ditadura da subsidio-dependência;
- Gerir as economias e a poupança mais do que os créditos e as dívidas não-pagas;
- Insuflar nova esperança mais do que entrar num certo desespero e na tristeza em nós e à nossa volta.
Cristamente temos responsabilidades acrescidas. Assim as saibamos assumir e compartilhar!

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

À descoberta do sentido da pertença...

Cada um de nós vive, aceita-se e enquadra-se, mais ou menos conscientemente, segundo vários círculos – sem qualquer linguagem esotérica nem outra afetação menos clara – de relacionamento e de comportamento: nascemos numa certa família, inseridos numa determinada localidade (mais ou menos bairrista, com beleza ou sem grande atração), no contexto de um certo concelho/distrito/província – para nos enquadrarmos na divisão territorial ainda em curso – e tendo, na devida conta, o país/nação e o continente mais alargado e culturalmente significativo.
Deixem, por isso, que concretize a minha história: nasci (ainda em casa e não na maternidade) numa família de gente honesta, simples e trabalhadora, numa freguesia semi-rural, num concelho do litoral, do distrito e diocese de Braga, inserida na província do Minho, do território de Portugal, que faz parte do continente da Europa (do sul), no hemisfério norte do planeta Terra... Tudo muito normal e simples... aparentemente!
No entanto, tudo isto condiciona a minha forma de pensar, de sentir, de reagir e até de rezar, pois aprendi a ler e a escrever, em tenra idade (graças a Deus e uma razoável ajuda humana) em português – embora tenha aprendido outras línguas com maior ou menor capacidade de expressão oral, por gestos ou na escrita – que se foi cuidando, na forma e no conteúdo, acrescentando a isto o mínimo enquadramento sócio-religioso, fazendo  a descoberta de pertença, tanto às várias configurações humanas como às incidências de leitura religiosa, que, foram quase sempre vividas, no contexto católico...
Quem quer que nos leia poderá fazer o seu diagnóstico de pertença e descobrirá, certamente, razoáveis surpresas, nas quais não tinha ainda reparado, convenientemente!

= Compreender as raízes ou abjurar as pretensões?
Pela mais simples nota familiar foi-me dado a beber que o que há de mais sagrado é quem nos dá – com que sacrifícios e em atitude de entrega – a vida e dela cuida, mesmo que à custa de muito trabalhado, esforçado, mal pago, mas honesto.
Aprendi, simbolicamente falando, a não ambicionar se não posso atingir a pretensão. Aprendi a não gastar mais do que aquilo que se pode. Aprendi a viver com pouco, mesmo que isso não seja benéfico para a nossa imagem. Numa palavra: quem não tem vícios não alimenta modas!
Sem qualquer ressentimento tenho visto que, ao perto e ao longe, há quem tente fazer crer que é pelo ter que se pretende deixar boa impressão, mesmo que à custa do incumprimento das obrigações e malbaratando os favores e ajudas... até de âmbito económico.

= Tentar construir algo de novo 
Na medida em que formos capazes de aceitar as nossas contigências – mas não em mera resignação – poderemos viver num certo estado de felicidade, onde o ser – cultural, ontológico e espiritual – se aprende não pela simples reivindicação mas pela assumpção da verdade de nós mesmos. Em nada deste plano está contido esse tão típico português do deixar correr, pois outros cuidarão do nosso futuro, mas antes temos de viver em esforço de competição, em ordem a deixarmos este mundo harmonioso e fraterno...depois de por ele termos passado, mais ou menos tempo, com maior ou menor destaque, mas sempre assumindo a construção de um mundo mais humano e mais cristão.  
Acreditamos que a nossa tarefa em tentarmos civilizar – passar do estado pagão (do campo) ao de cidadão (na cidade) – este mundo passa pela interpenetração da consciência cristã de que somos cidadãos de duas cidades – a terrena e a celeste – com plena participação em ambas, respeitando a esfera de cada uma, mas fazendo crescer a cidade terrestre pela tranfiguração ativa da missão recebida rumo à cidade celeste.
Basta de excomunhões e de anátemas sobre este mundo, pois foi neste espaço e neste tempo que Deus nos fez viver agora. De pouco adiantará tentar fugir do mundo ou refugiar-se na religião, se não formos capazes de divinizar tudo e todos à nossa volta. Pelo verdadeiro sentido de pertença é que podemos evangelizar!

António Sílvio Couto